quarta-feira, 9 de abril de 2014

"Salvem a professorinha"

Atendendo a um pedido do meu amigo +Joao Paulo vou tecer algumas considerações sobre o imbroglio envolvendo a Valesca Popozuda numa questão de filosofia.

O autor da prova, o professor Antonio Kubitschek disse em uma entrevista que a fez em tom de provocação para a imprensa.

Na questão, que reproduzo em seguida, faz a alusão à Valeska como sendo uma "grande pensadora contemporânea".



Epistemologicamente, é um grande equívoco chamá-la de pensadora. Faltariam à cantora aqueles elementos considerados fundamentais para tanto: A ausência de uma sistematização de pensamento, de um rigor conceitual e técnico, além da inexistência de um arcabouço filosófico. A falta desse conjunto a levaria para longe desse patamar. Não sei da formação do Prof. Kubitschek, e também não pretendo fazer disso um cavalo de batalha, mas qualquer estudante de filosofia saberia muito bem fazer esse discernimento.

Todavia, o uso das aspas, como utilizei acima, poderia matizar melhor a questão e deixá-la em conformidade com o que reza a teoria, e isso talvez aplacasse os ânimos do público. Mas duvido muito que os resultados dessas ações seriam diferentes do que vimos nas redes sociais.

Seguindo pelo viés da polêmica, vejo  que o professor foi bastante feliz, pois conseguiu mobilizar as atenções da imprensa para a escola. Nas palavras do professor, “muitas vezes, acontecem coisas positivas no colégio, como exposição de fotografia, e ninguém da imprensa nunca foi lá mostrar”. (até então contabilizei 10 entrevistas concedidas à jornais e emissoras de tv, fora os artigos e reportagens a respeito).

Todas as pessoas diretamente envolvidas no processo, do professor aos alunos, passando pela coordenação, estavam cientes e contextualizados com o problema, que girava em torno do debate sobre a formação moral e os valores da sociedade (e do quanto a imprensa contribuía para esse processo). Enfim, todos estavam conscientes, menos a grande imprensa - que juntamente com as redes sociais orquestraram uma verdadeira pilhagem pessoal. A voracidade com que trataram de ridicularizar o professor, antes mesmo de qualquer apuração dos fatos, era algo de se esperar da turba que frequenta o Facebook, mas não de jornalistas profissionais. Poucos foram até o professor indagar o porque dessa prova, e a maioria já tratou de preparar o calvário do professor, da escola e da educação brasileira como um todo.

(Gostaria de saber o que esse povo revoltoso andou lendo nos últimos meses)

Vejam bem, não estou na posição de inquisidor ou de especialista em educação para atestar "o fim da escola", pois acredito apesar de caminhando para esse fim - felizmente, ainda estamos bem longe disso. Mas não é de hoje que eu venho falando da crise da educação, muito mais séria que a questão da Valesca Popozuda. Não se trata da crise de um determinado modelo pedagógico (e o Paulo Freire não tem nada a ver com isso), mas de um projeto de educação que talvez sequer tenha existido de fato.

A grande tragédia da educação no Brasil é ver a escola agonizar, gritando desesperada e tendo que cometer essas desmesuras pra chamar atenção para uma questão básica, que é da sobrevivência. Essa é a minha interpretação para a questão da Valesca Popozuda. Um grito de agonia.

E esse é o quadro agonizante em que nos encontramos hoje. Falta planejamento, falta incentivo para os docentes, falta estrutura para pensar um futuro melhor. E caso eu esteja equivocado, me apontem aqui um governo que tenha um projeto educacional realmente consistente e que contemple essas demandas que falei há pouco. O que temos na real são professores sobrevivendo com salários miseráveis, escolas sobrevivendo com investimentos pífios na sua estrutura e na qualificação de seus espaços, e planos de educação sendo feitos com perspectivas curtas e moldados de acordo com a ideologia política e econômica vigente.

O mais triste e doloroso disso tudo é que quando a grande massa deixar de bradar absurdos contra o professor, a escola e a educação, virarão as costas para xingar outro problema, que certamente será mais interessante. Porque no final das contas, é tudo uma questão de indiferença.

Ficarei ainda mais preocupado quando acontecer algo semelhante e ninguém ver nenhum problema nisso.